sábado, 11 de junho de 2016

Opinião Cosme Rímoli

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Os 16 segundos mais degradantes do futebol brasileiro. A imagem do pai carregando o filho nos braços para escapar do gás pimenta em Brasília. Não adiantou nada. A CBF liberou o Mané Garrincha para Fluminense e Corinthians. Vitória dos vândalos…


125 Os 16 segundos mais degradantes do futebol brasileiro. A imagem do pai carregando o filho nos braços para escapar do gás pimenta em Brasília. Não adiantou nada. A CBF liberou o Mané Garrincha para Fluminense e Corinthians. Vitória dos vândalos...
Foram os 16 segundos mais degradantes do futebol brasileiro nos últimos tempos. De dilacerar a alma de quem é pai. Ou mesmo de quem não tem essa bênção. O montador de móveis Fabiano de Lima descendo as escadas do estádio Mané Garrincha. Com seu filho Kaylon, nos braços. Fabiano chorava e tentava consolar o menino que tem paralisia cerebral. O garoto não consegue andar, falar. Se comunica com os pais com o olhar.


O pai tirava o filho das arquibancadas do estádio. Do alcance do gás pimenta usado pela Polícia Militar de Brasília. Foi o recurso que os policiais decidiram usar para separar uma violenta briga entre as organizadas do Palmeiras e Flamengo. A fumaça afetou não só os vândalos. Mas chegou aos torcedores comuns e até aos jogadores. O intervalo durou 22 minutos por causa da selvageria.
Fabiano é palmeirense fanático. E fez desse amor incondicional ao time um elo com seu filho especial. Kaylon se acostumou desde bebê a usar a camisa verde. Vai com ela para todos os lugares possíveis. O pai o coloca para assistir futebol, os jogos do Palmeiras na tevê. Eles moram com a mãe Cláudia e a irmã Ana em Samambaia, cidade satélite a 25 quilômetros de Brasília. São pobres.
O pai faz parte da triste estatística dos 11 milhões e quatrocentas mil pessoas desempregadas no país. Faz serviços esporádicos. A família passa por dificuldades. Mas ele não pensou duas vezes ao saber da rara oportunidade de ver o Palmeiras em Brasília. Daria este presente, essa alegria para Kaylon.
Assistiriam do estádio ao time de coração. Kaylon precisa de uma cadeira de rodas para se locomover. Não seria fácil. Mas Fabiano não desistiu. Seria inesquecível. Para ele e para o filho. Os dois mereciam esse fugaz momento de felicidade.
Ao chegar no estádio, Kaylon sentiria que faz parte de uma família. A camisa 9 verde o faria igual aos milhares de palmeirenses que foram ao estádio. A organização do evento sonhava que seria uma festa. Daria o exemplo. Principalmente a São Paulo, cujas autoridades optaram por permitir apenas torcida única em clássico.
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Não haveria separação entre palmeirenses e flamenguistas. Os torcedores comuns. Já os organizados, conhecidos por seus vândalos, ficariam longe um do outro. Não haveria problema, acreditavam os organizadores.
As uniformizadas dos dois times se odeiam. Já houve mortes de lado a lado em confrontos sangrentos, com direito a tiros e ônibus incendiados. No intervalo, as organizadas do Palmeiras decidiram que haveria briga. Não precisaram de gênios para o confronto desejado. Em vez de enfrentar os policiais que os separavam dos flamenguistas, deram a volta no estádio. Pronto, briga violenta. Só separada pelo uso do gás pimenta.
Por causa da selvageria de suas torcidas, Palmeiras e Flamengo correm o risco de perder dez mandos de jogos. As duas diretorias se uniram contra o que consideram injustiça. Prometem brigar juntas contra a punição. O STJD tem a oportunidade de dar um exemplo. Mostrar que infelizmente o clube é responsável pela atitude de seus torcedores. Diante da incompetência das autoridades em punir os vândalos, impedir que entrem nos estádios, é um recurso esportivo.
Na esperança que esses criminosos percebam o quanto estão prejudicando o time que dizem amar. O efeito colateral óbvio é que os torcedores comuns pagam por esses vândalos. Mas algo precisa ser feito. Principalmente o time mandante precisa responder por tudo de irregular que acontecer no estádio.
As cenas são públicas.


O STJD tratou de interditar o estádio. Não é possível que seja tão fácil duas torcidas se encontrarem para brigar. Quando foi projetado para a Copa de 2014 se levou em conta o convívio civilizado entre pessoas. Não o ingresso de gangues dispostas a se matar. As portas precisam ser reforçadas, blindadas. Não são cidadãos comuns que querem ver um jogo de futebol. Mas vândalos cuja alegria é espancar, machucar e até matar quem vista uma camisa de outra cor, que não a sua.
Fabiano chorou porque acreditou que essa selvageria não chegaria em Brasília. Não estragaria a custosa festa que estava proporcionando a Keylon. Mas sua felicidade acabou com o gás pimenta embaçando a vista do filho, dificultando a respiração do seu pequeno.
Sem o prazer imenso de ouvir a voz do filho, os olhares bastam. E ele percebeu o quanto Keylon estava assustado, sem entender por que tinha dificuldade em respirar. Seus olhos e garganta ardiam.
Fabiano se desesperou, chorou. Pegou o filho nos braços. Pediu que funcionários do estádio levassem a cadeira de rodas. Não daria a volta normalmente. Desceria os degraus para se afastar mais rapidamente. Queria lavar o rosto de Keylon, ficar longe do gás de pimenta para respirar melhor.
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Palmeirenses e flamenguistas sentados nas arquibancadas olhavam consternados o esforço do pai. Seu desespero. Suas lágrimas. Enquanto descia as escadas balbuciava palavras de carinho. E se desculpava com Keylon. Foi ele quem levou o filho amado para este cenário degradante.
Ele descia os degraus torcendo para não encontrar outro foco de briga entre homens com almas de pit bulls. Enquanto isso, as câmeras de televisão registravam o seu drama. Mostravam para brasileiros o que estão expostos quando decidem ir a uma partida de futebol. Ainda mais cometendo o desatino de levar seus filhos.
Os 16 segundos são de fazer questionar até onde pode chegar a degradação humana em um estádio. Fabiano e sua família estão incomodados com o inesperado assédio da imprensa.
A diretoria do Palmeiras os convidou para conhecer o clube, os jogadores. Promete dar camisas, ingressos, carteira de sócios para Fabiano e Keylon. Vai filmar o evento e colocar as imagens nas redes sociais. Não está certo. Deveria fazer tudo isso para os dois, mas manter de maneira discreta. Para que o ato de solidariedade não vire exposição barata, oportunismo. Paulo Nobre deveria pensar dez vezes antes de autorizar que sejam divulgadas fotos e vídeos dos dois no Palmeiras. Eles já foram expostos demais.
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Fabiano segue envergonhado, chocado.
Foge dos jornalistas.
Sabe que estão dando plantão na escola de Keylon.
Sabe que, como pai, quis dar um presente ao amado filho.
Seria, se este país fosse civilizado.
Não o berço da impunidade.
Ainda mais no futebol.
Tanto é verdade que o Fluminense já alardeia.
Conseguiu a liberação do Mané Garrincha.
Fará sua partida contra o Corinthians lá, na próxima quinta-feira.
Quem deu o aval para o jogo, assumiu a responsabilidade?
A CBF.
Que outros pais pensem duas vezes antes de ir à partida.
Principalmente levando suas maiores bênçãos.
Seus filhos.

Que as lágrimas de Fabiano não tenham sido à toa...

autor ; Cosme Rímoli

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