LUTA PELO SONHO
Futebol é campo de oportunidades e ilegalidades no trabalho infantil
Clubes e escolinhas vinculadas a clubes devem garantir direitos dos atletas em formação. Caso contrário, podem ser consideradas "deformadoras", afirma especialista
A regra é clara. O direto à diversão, à prática do lazer e do esporte é assegurado aos jovens pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A prática é bem diferente. Lugares como o trânsito, a praia e os lixões guardam mãos e mentes juvenis guiados pela obrigação da sobrevivência adulta e desviados de seus direitos fundamentais.
Atividades esportivas como o futebol, que por um lado surgiriam como oportunidade de fuga dessa ilegalidade, por outro podem acentuá-la, privando o menor de seus direitos. Cedo crianças se iniciam na prática do principal esporte do País, sonhando com sucesso profissional no futuro. Em escolinhas, clubes, times de futebol de bairro ou mesmo em peladas, garotos dão os primeiros passos rumo à carreira, que poderá lhes responder com muito mais nãos do que sins.
Os pais, quando não rejeitam prontamente o desejo de realização na área ou demonstram indiferença, embarcam junto a eles em busca do sonho, muitas vezes sem se darem conta das situações de vulnerabilidade pelas quais os filhos podem passar. O caso de Cristiano e dos meninos levados a São Paulo neste ano por um suposto olheiro é um exemplo das difícieis situações que podem surgir na trajetória.
O percurso profissional em qualquer área tem idade legal mínima para começar. A legislação brasileira prevê a proibição de qualquer forma de trabalho a menores dos 16 anos de idade, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14. Neste caso, a atividade laboral deve ser compatível com a frequência escolar e o desenvolvimento do adolescente.
No caso específico do trabalho infantil do esporte,a Lei nº 9.615, conhecida como Lei Pelé, reforça que a formação profissional do atleta deve começar apenas a partir dos 14 anos. Além disso, existem requisitos legais para entidades de prática desportiva formadora, que incluem escolas de futebol vinculadas a clubes ou os próprios clubes.
“O clube formador tem de preencher a vários requisitos, como inscrever o atleta em competições de acordo com sua idade, oferecer condições médicas, psicológicas e odontológicas e garantir condições de alojamento adequado. Além disso, o atleta em formação tem de ter, no máximo, 4h por dia de treino”, explica Álvaro Melo Filho, doutor em Direito Desportivo e membro da Federação Internacional de Futebol Associado (Fifa).
LUTA PELO SONHO
Futebol é campo de oportunidades e ilegalidades no trabalho infantil
Murilo Viana | 17h11 | 31.07.2014
Clubes e escolinhas vinculadas a clubes devem garantir direitos dos atletas em formação. Caso contrário, podem ser consideradas "deformadoras", afirma especialista
Foto: Fabiane de Paula
A regra é clara. O direto à diversão, à prática do lazer e do esporte é assegurado aos jovens pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A prática é bem diferente. Lugares como o trânsito, a praia e os lixões guardam mãos e mentes juvenis guiados pela obrigação da sobrevivência adulta e desviados de seus direitos fundamentais.
Atividades esportivas como o futebol, que por um lado surgiriam como oportunidade de fuga dessa ilegalidade, por outro podem acentuá-la, privando o menor de seus direitos. Cedo crianças se iniciam na prática do principal esporte do País, sonhando com sucesso profissional no futuro. Em escolinhas, clubes, times de futebol de bairro ou mesmo em peladas, garotos dão os primeiros passos rumo à carreira, que poderá lhes responder com muito mais nãos do que sins.
Os pais, quando não rejeitam prontamente o desejo de realização na área ou demonstram indiferença, embarcam junto a eles em busca do sonho, muitas vezes sem se darem conta das situações de vulnerabilidade pelas quais os filhos podem passar. O caso de Cristiano e dos meninos levados a São Paulo neste ano por um suposto olheiro é um exemplo das difícieis situações que podem surgir na trajetória.
Leia mais:
O percurso profissional em qualquer área tem idade legal mínima para começar. A legislação brasileira prevê a proibição de qualquer forma de trabalho a menores dos 16 anos de idade, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14. Neste caso, a atividade laboral deve ser compatível com a frequência escolar e o desenvolvimento do adolescente.
No caso específico do trabalho infantil do esporte,a Lei nº 9.615, conhecida como Lei Pelé, reforça que a formação profissional do atleta deve começar apenas a partir dos 14 anos. Além disso, existem requisitos legais para entidades de prática desportiva formadora, que incluem escolas de futebol vinculadas a clubes ou os próprios clubes.
“O clube formador tem de preencher a vários requisitos, como inscrever o atleta em competições de acordo com sua idade, oferecer condições médicas, psicológicas e odontológicas e garantir condições de alojamento adequado. Além disso, o atleta em formação tem de ter, no máximo, 4h por dia de treino”, explica Álvaro Melo Filho, doutor em Direito Desportivo e membro da Federação Internacional de Futebol Associado (Fifa).
O professor ressalta que apenas escolas vinculadas a clubes de futebol que tenham sido devidamente verificadas e aprovadas por entidades como a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), a nível nacional, e a Federação Cearense de Futebol (FCF), no Estado do Ceará, podem oferecer as condições ideais, previstas em lei, para a formação do atleta. Sem vínculo com clubes, escolas são consideradas “marginais” e “deformadoras”, segundo ele.
Na hora de escolher a escola ou clube, é fundamental o acompanhamento e a atenção dos pais. “O importante é saber se não há situações anteriores em que esses direitos foram desrespeitados, verificar se a empresa cumpre com os direitos e as obrigações dos atletas em formação”, defende o procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho no Ceará (MPT-CE), Dr. Antonio Lima.
A legislação também defende que o primeiro contrato de trabalho entre o atleta e o clube só poderá ser firmado a partir dos 16 anos de idade, com prazo máximo de cinco anos. É definido ainda que o atleta não profissional em formação, maior de 14 e menor de 20 anos, poderá receber uma bolsa de aprendizagem “livremente pactuada” com o clube por meio de contrato, sem que seja gerado, no entanto, um vínculo empregatício.
Idade mínima para iniciação profissional gera divergência
Na avaliação do doutor Álvaro Melo Filho, um dos grandes entraves da Lei Pelé é a idade mínima de 14 anos para que clubes e escolas de futebol possam iniciar atividades de formação profissional. O especialista defende uma antecipação para os 12 anos, de acordo com o que a Fifa prevê, e cita o exemplo da Alemanha, onde essas atividades começam a partir dos 11 anos.
A não iniciação desde cedo nessas atividades profissionalizantes dos clubes acabam favorecendo à ação de olheiros “oportunistas”, com objetivos unicamente financeiros, e à prática do trabalho infantil em outras situações, de acordo com ele. “É um absurdo. Parece ser preferível que, ao invés de estar treinando, a criança fique no sinal, pedindo esmola”, critica.
Já para o procurador Dr. Antonio Lima, a redução dessa idade mínima iria ferir a Constituição, que defende o trabalho apenas a partir dos 14 anos, na condição de aprendiz, e representaria uma priorização do trabalho em razão da garantia de diretos como a educação e a convivência familiar.
“Cerca de 99% dos que embarcam no futebol não conseguem ser os profissionais de destaque que almejam. Muitos deles dedicam tempo demais ao esporte e pouco tempo à educação”, argumenta . O procurador também ressalta que, frente ao insucesso na carreira , menores podem buscar recuperar os estudos tardiamente e, assim, terem dificuldades no acesso a outra carreira.
Diário do Nordeste
Nenhum comentário:
Postar um comentário