por Cosme Rímoli
Goleada espetacular do São Paulo contra o Toluca. O acaso foi cúmplice. E o desprezado Centurión decidiu o jogo. Ganso teve noite de maestro. Vaga para as quartas está nas mãos do time de Bauza…
Desde 12 de dezembro de 2012, a torcida do São Paulo não tinha uma noite tão feliz. Há três anos e oito meses, o clube era campeão da Copa Sul-Americana. Desde então, não ganhou título algum. E nem conseguia uma vitória tão empolgante, marcante quanto a de ontem. Inesperados 4 a 0 contra o Toluca, pelas oitavas de final da Libertadores, a competição mais desejada.
O Morumbi lotado, com recorde de público no Brasil em 2016. 53.241 torcedores foram ao estádio preocupados. O time de Bauza havia se classificado para as oitavas de final suando sangue. Empatando contra o Strongest, na Bolívia. Iria pegar o Toluca, quinto melhor classificado. O bipolar São Paulo de Bauza foi apenas o 12º colocado. Tinha de conseguir uma boa vantagem neste jogo de ida. Mesmo sem o seu principal jogador Calleri, que o clube tentou desesperadamente livrar de suspensão na Conmebol. Não conseguiu.
Foi quando o acaso resolveu interferir. "O Centurión não ficaria nem no banco de reservas, se fosse revertida a suspensão do Calleri. Como não conseguimos, quem deveria começar jogando seria o Alan Kardec. Quando se está com os atletas todos os dias, é possível conhecê-los apenas vendo caminhar. E eu não vi o Kardec bem para começar. Esperei chegarmos ao estádio para dizer que ele não começaria porque eu não o vi bem. Centurión treinou com muita gana, rápido e intuitivo. São escolhas que às vezes saem bem, outras não. Por sorte para o São Paulo essa saiu bem", revelou Bauza.
E a presença do argentino, jogador com o pior rendimento no São Paulo, em 2016, mudou a partida. A ponto de na madrugada desta sexta-feira, ele postar no Instagram. Uma foto, fazendo um coração com as mãos, na comemoração do primeiro dos dois gols que marcou. E ainda usar um palavrão para desabafar.
"Para vos mi amor. Melody te amo con la vida. Vamos são Paulo carajo."
Centurión estava dedicando a sua melhor partida com a camisa tricolor à Melodi Pasini, sua noiva. Ela vem travando uma batalha com um câncer inguinal. Todos no Morumbi sabem o quanto o drama vivido pelo jogador o tem atrapalhado. Principalmente Bauza, técnico argentino que acompanhou seu ótimo momento no Racing, a ponto de ter sido contratado por empréstimo pelo Genoa da Itália.
O atacante de 23 anos vivia até ontem o seu momento mais baixo, de mais descrédito no Morumbi. O Vitória da Bahia já o pedia por empréstimo. O gerente Gustavo Vieira estudava uma troca com clubes argentinos. O diretor de marketing, Vinícius Pinotti, que doou R$ 12 milhões ao clube para a contratação do atacante já se conformava com o fracasso da transação.
Até o jogador sabia. Seria o primeiro a ir embora na reformulação que o clube fará no meio do ano.
Mas ontem pode ter sido a inesperada reviravolta. Contra o Toluca, Centurión se impôs. Correu, driblou, teve confiança, provou. Foi o atacante de velocidade que se destacou no Racing. Marcou dois gols, o primeiro deles, um golaço. Com direito a um golaço, com chute cruzado da entrada da área, no ângulo de Talavera.
A comemoração foi emocionante. Primeiro, ele deu alguns passos desengonçados de cumbia, ritmo de Carlitos Tevez consagrou por aqui. Depois foi abraçado por todos os jogadores, que acompanham diariamente seu drama. Chorou bastante. Depois se ajoelhou, agradecendo aos céus. E aí, o 'coração' à Melody.
"Foi gol o mais lindo, sem dúvida, mas não foi o mais importante, já que marquei um gol pelo Racing que garantiu o título de campeão argentino. Mas foi um gol muito bonito. A cumbia foi para a minha noiva e para os meus amigos, acredito que todos devam estar muito felizes com tudo que aconteceu hoje."
Atuação de Centurión à parte, o São Paulo fez ontem uma partida empolgante. Bauza sabia muito bem que o Toluca estava desfalcado de seis jogadores. Dois laterais, dois meias e dois atacantes. Mas o treinador paraguaio José Cardoso não se mostrava tão tenso esperava. Sabia da má fase do rival. Esperava travá-lo com duas linhas de quatro. Atuaria no 4-1-4-1. O sonho era conseguir um empate e decidir a vaga no México, usando a seu favor os 2.600 metros de altitude.
Mas ele não sonhava com a postura firme, a marcação alta feita com perfeição, raiva, vontade. Nem com a atuação de gala de Paulo Henrique Ganso. Inspirado, ele foi o maestro do jogo. Ditou o ritmo do massacre. Ensandecido, com toques de primeira, tabelas, lançamentos, viradas inesperadas, ele destruiu o sistema defensivo mexicano. Distribuiu dribles, chapéus. A cada pontapé que tomava, melhor jogava. Pelo aspecto emocional, pelo drama, Centurión dominará os noticiários de hoje. Mas o desempenho de Ganso foi fabuloso. Como há muito tempo não tinha.
Michel Bastos também se impôs. Aproveitou o espaço que teve na esquerda e criou várias chances de gol. Marcou o seu gol, o que deu início à goleada. Depois de um lateral cobrado por Bruno, a bola subiu e encobriu Paulo da Silva. O jogador pegou de primeira. Gol com raiva. Comemorou em cima do distintivo do São Paulo, ouvindo a comemoração de milhares de torcedores que o queriam longe do Morumbi. A partida de ontem o reaproximou de vez dos são paulinos.
O São Paulo continuou com um ritmo impressionante. Centurión, marcou no final do primeiro tempo, um gol lindíssimo. E Thiago Mendes tabelou com Ganso e fez, com tranquilidade, 3 a 0. Depois, o argentino renegado ainda usou a raça, trombou com os zagueiros, e marcou 4 a 0.
Aos 32 minutos do segundo tempo, Bauza deu um presente ao esgotado atacante. O trocou por Wesley. Centuríon foi aplaudido de pé, teve seu nome gritado por mais de 50 mil torcedores, que na quarta-feira o queriam longe do Morumbi. Mais emoção.
Dramaticidade à parte, o São Paulo fez uma partida incrível. Chutou 24 bolas à gol. Contra apenas três dos mexicanos. Além dos quatro gols, acertou duas vezes a trave. Teve 60,2% de posse de bola. Abriu uma vantagem fabulosa para a partida de volta.
Mas Bauza exige pés no chão.
"Os jogadores estavam festejando no vestiário, mas eu já disse a eles para não festejarem nada porque não ganhamos nada. Faltam 90 minutos e vamos lutar para conseguir a classificação. Se quisermos ficar entre os oito melhores da América, teremos de correr muito. As dificuldades serão cada vez maiores, em Toluca teremos 2.800 metros de altura. Conheço o técnico deles, ele fará de tudo para dar a volta por cima."
E já avisou. Denis voltará ao gol como titular. Renan Ribeiro à reserva.
Calleri também terá de volta sua posição.
Centurión será reserva.
Mas ele não se importa.
Depois de ontem, está renascido.
O frustrante Grêmio de 2016. Clube prometia ter um time espetacular. Mas já acumula duas eliminações e está à beira da queda : na Libertadores. Estar fora da final do Gaúcho tornou o ambiente insuportável…
"Os estaduais só têm importância para quem perde." O clichê ganha força ano após ano. Principalmente envolvendo os 12 maiores clubes do país, os que costumeiramente estão entre os que disputam a Libertadores da América. Os quatro grandes de São Paulo, os quatro do Rio, dois do Rio Grande do Sul e dois de Minas Gerais.
Ano após ano, eles seguem sendo atrapalhados, tendo sua caminhada na Libertadores truncada pelo desempenho nos inúteis estaduais. O maior exemplo de 2016 acontece com o Grêmio.
A equipe de Roger terminou 2015 incensada. Colocada como uma das sete maravilhas da humanidade. O time sem investimento conseguiu o terceiro lugar no Campeonato Brasileiro. Marcando forte, confiança, sufocando o adversário, atuando de forma intensa. Transformando sua arena em um caldeirão fervente para os adversários.
A surpreendente do segundo semestre do ano passado provou o acerto. A troca do demitido Luiz Felipe Scolari por Roger foi excelente para o clube. A perspectiva para 2016, maravilhosa. Tanto que a diretoria se esqueceu da sua obrigação de economizar e investiu R$ 19,5 milhões por 70% de Bolaños, melhor atacante do Equador.
A direção acreditava que 2016 seria um ano histórico. Três competições logo de cara. A Libertadores, a Primeira Liga e o Campeonato Gaúcho. O foco, anunciado pelos dirigentes, seria competição sul-americana. E a campanha foi mais do que aceitável. No grupo 6, anunciado como o 'de morte', ficou em segundo lugar. Só atrás do Toluca. Eliminou o San Lorenzo e a LDU.
Só que enquanto acumulava três vitórias, dois empates e apenas uma derrota, os gremistas tiveram pela frente a eliminação da Primeira Liga. Não houve muita repercussão porque os dirigentes acabaram se submetendo à CBF. E a competição virou fantasma.
Mas no Rio Grande do Sul não se brinca com o Campeonato Gaúcho. Lá é um estado alucinado, repartido pelo azul e vermelho. A ponto de se contar os Grenais. Desde 2010, o Grêmio não conquistava o título. O grande rival, o Internacional já era pentacampeão. Havia chegado a hora de acabar com esse domínio colorado, apostavam os dirigentes.
Só que o elenco de Roger não suportou disputar dois torneios a sério. E acabou sucumbindo na semifinal do Gaúcho. Caiu diante do Juventude, de Antônio Carlos. O resultado tratado como um vexame descabido. O provincianismo dominou o cenário. Todos se esqueceram que haviam prometido priorizar a Libertadores. No Rio Grande do Sul isso não funciona.
Roger, o time e a diretoria, principalmente, o diretor-executivo Rui Costa, ficaram encurralados. O advogado vê o seu trabalho imensamente questionado.
A situação seria comparável com o que aconteceria com Tite se o clube não tivesse conquistado o hexacampeonato brasileiro em 2015. O vexame que passou diante do Audax teria outra proporção. A eliminação para o Juventude, segundo fracasso no ano, tornou o ambiente perto do insuportável. Tão alta foi a festa da metade vermelha do Rio Grande.
Para piorar as coisas, Geromel resolveu pegar caxumba. E ficou exposta o quanto a zaga gremista é limitada. O time competitivo, bombardeado de críticas, tinha pela frente ontem o Rosário Central. Time muito bem montado por Eduardo Coudet, treinador que precisa ser melhor observado pelos clubes brasileiros.
Na arena gremista, 31.742 torcedores esperando a redenção. Jogo de mata-mata contra um dos grandes argentinos. Primeiro jogo depois do vexame do Gauchão. A melhor maneira de mostrar que tudo estava no seu lugar seria uma vitória importante, marcante.
Só que os argentinos usaram a mesma arma que dominou o Palmeiras na fase de grupos. Em plena arena verde, com seis reservas, dominou o jogo. Cansou de desperdiçar gols. Foi um massacre. No fim, a derrota inacreditável por 2 a 0. Mesmo massacrando o time paulista.
Contra o Grêmio, a equipe já estava mais forte. E sabendo o que precisava fazer.
Marcação alta, impedindo a saída de bola gremista. Pressão consciente, firme. Os gaúchos ficaram travados. Apelaram para chutões, presentes para os argentinos. Para doer mais ainda a derrota, o gol do Rosário Central nasceu de uma falha bizarra de Fred, Bresan e Ramiro. Marco Ruben chutou com toda a força, quase jogando Marcelo Grohe para as redes.
A torcida se desesperou na arena. Inconformada com a perspectiva de terceira eliminação seguida em três meses de temporada. A cabeça de Rui Costa está à prêmio. O motivo foi a expectativa que ele criou em 2016.
Todos esperavam um Grêmio espetacular.
Não ridicularizado por jornal argentino.
O que está se vendo é equipe previsível.
E cheia de falhas.
As contratações não foram certeiras, cirúrgicas.
O elenco segue com zaga insegura.
Fraca saída de bola, volantes lentos, marcáveis.
Jogadores importantes que somem em jogos decisivos.
Como é o caso de Luan.
A situação está muito conturbada.
Erros nas contratações são a base do fracasso.
Mas o peso que tem o Gauchão é algo indiscutível.
A ponto do presidente Romildo Bolzan passar vexame desnecessário.
Ele quis desviar o foco da eliminação da final diante do Juventude.
E falou o que não deveria.
"Se jogarmos como hoje (domingo) poderemos fazer cinco no Rosário Central."
Pobre de quem se iludiu com suas palavras.
O Grêmio perdeu por 1 a 0, com direito a ser dominado.
E tomar bola no travessão.
Se havia um time que merecia perde por vários gols foi o gaúcho.
Agora, o clube tenta recolher os cacos.
Escapar da desconfiança e sonhar com uma reviravolta na Argentina.
O jogo será quinta-feira em Rosário.
Se for confirmada a eliminação, muita coisa deve mudar no Olímpico.
Para quem acreditava que teria um ano histórico...
Três eliminações seguidas é algo inaceitável.
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