domingo, 23 de outubro de 2016

Violência no futebol

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O recrudescimento da violência ligada ao futebol nos últimos meses volta a atingir, infelizmente, o preocupante patamar de outrora. Agora, não estamos mais falando só de torcidas organizadas violentas que convivem em ambiente de forte rivalidade, mas de gangues de criminosos comuns, a maior parte deles, profissionais que vivem do crime e fazem dele, seu modo normal de vida. Traficantes de drogas, assaltantes e latrocidas, muitos deles procurados pela Justiça. Há agora, um novo componente explosivo. No passado, a violência estava toda ligada às chamadas torcidas organizadas, que tinham na rivalidade do futebol, sua motivação maior para delinqüir.
Naquele momento, foi preciso que o Ministério Público empregasse uma estratégia capaz de levá-las à asfixia. Paralelamente, ficaram proibidas de ingressar nos estádios, até que se submetessem a um amplo recadastramento, sofrendo sensível redução de sua importância. Infelizmente, a violência foi migrando para fora de seus limites. Aos poucos, começaram a surgir pequenas células independentes, constituídas por poucos integrantes. A nova forma de violência, mais difícil de ser visualizada, passou a não ter sede ou site oficial, surgindo a qualquer momento, em qualquer lugar.
Utilizando-se das redes sociais e muitas vezes usando clandestinamente o nome de torcidas organizadas famosas, mas sem real vinculação com elas, os marginais têm marcado encontros para acertos de contas, incluindo aí, partilha do produto de crime.
Tudo acaba então, se fundindo. O torcedor violento, o membro de torcida,  e o criminoso profissional, que se infiltra nesse meio. Para essa nova forma de criminalidade, não adianta apenas proibir torcida de entrar no estádio. Somente o trabalho de inteligência continuado desenvolvido pela Polícia e Ministério Público poderá reverter o fator surpresa que os marginais, têm em relação ao Estado.

autor ; Fernando Capez


O histórico da violência nos eventos esportivos



São muitos acontecimentos de brigas nos últimos anos que trouxeram novamente a discussão da violência nos estádios brasileiros e aos arredores à tona, na década de 70 e 80 já existiam as brigas entre os torcedores, porém, entre eles havia uma tradição de brigas na mão, os torcedores brigavam sem o uso de nenhum acessório, conforme a população brasileira foi crescendo, proporcionalmente mais pessoas associaram-se nas torcidas organizadas e na década de 90, aparecem casos de brigas com uso de facas e armas brancas e logo após até mesmo o uso de armas de fogo, consequentemente, a violência entre torcidas organizadas aumenta e o número de mortes em brigas de torcida também, com isso, se cria um sentimento de ódio e vingança perante as torcidas.
O início dos Anos 90 é considerado o período mais violento das torcidas organizadas, foi no ano de 1995 que ocorreu um episódio trágico que marcou a violência entre torcidas, no dia 20 de agosto de 1995, foi em um jogo válido pela final da Super Copa SP de Juniores, entre os clubes São Paulo e Palmeiras, os torcedores após o término do jogo, com a vitória do Palmeiras, entraram em conflito no campo do Estádio do Pacaembu, dentre mais de 100 (cem) feridos, o torcedor são-paulino Márcio Gasparin da Silva, 16 anos, foi morto com pauladas na cabeça dadas pelo torcedor palmeirense Adalberto Benedito dos Santos (na época integrante da Mancha Verde), condenado de 12 anos de prisão.
“A torcida do Palmeiras (Mancha Verde), invadiu o gramado do Pacaembu e foi do outro lado comemorar na frente da torcida do São Paulo (Torcida Independente).” (Fernando Capez, Promotor de Justiça na época)
“Houve uma revolta por parte desses torcedores que investiram contra a torcida do Palmeiras com paus e pedras e depois vindo a invadir o campo” afirma Danilo Zamboni, fundador da Torcida Tricolor Independente.
Os paus e pedras que foram usados pelos torcedores naquele dia eram resíduos de uma reforma que estava sendo feita no Estádio do Pacaembu, além disso a Polícia Militar estava com um contingente reduzido não conseguiu conter a briga dos torcedores, que teve este fim trágico, o líder da torcida Mancha Verde na época, Paulo Serdan, foi indiciado criminalmente pelo confronto, entre as torcidas organizadas.
“Como que pode se marcar um clássico de uma rivalidade enorme, em um estádio aonde, você tem todo um arsenal à disposição, então como é que você pode ir pra um evento desse, com uma incompetência tamanha instalada, parece que a coisa foi meio que deixada acontecer” disse Paulo Serdan, líder da torcida Mancha Alviverde na época.
Após esse dia trágico que ficou marcado na história do futebol paulista, não resta dúvidas que se tivesse um planejamento da Federação Paulista de Futebol e da Polícia Militar, este confronto poderia ter sido evitado e não teria ocorrido aquela morte do torcedor Márcio Gasparin da Silva.
Isso fez com que as autoridades tomassem medidas repreensivas contra as duas torcidas, não dava para deixar passar tal fato desapercebido, a imprensa registrou e houve uma repercussão negativa, então o Ministério Público resolveu intervir, o Promotor de Justiça na época Fernando Capez, após analisar as imagens da batalha campal pediu a extinção das torcidas organizadas, ficando proibidas de entrarem nos estádios com suas camisetas, bandeiras e instrumentos musicais.
“Essa tragédia na verdade foi o ponto final, naquela escalada de violência, quando nós então verificamos que, a própria Polícia Militar e a Federação Paulista de Futebol sozinhas, não conseguiriam colocar um fim naquela situação, aí o Ministério Público resolveu entrar” disse Fernando Capez
Entretanto, mesmo com a proibição das torcidas organizadas, os torcedores uniformizados continuaram a frequentar o estádio, não com os trajes da torcida, mas com as camisas de seus clubes e as brigas continuaram. Outra maneira de tentar escapar dessa proibição, foi mudar os nomes das torcidas que já estavam proibidas, a torcida Mancha Verde passou a ser chamar Mancha Alvi-Verde e a Independente virou Torcida Tricolor Independente, mas a presença de símbolos de torcidas organizadas em São Paulo ficou proibida até o ano de 2003, quando o Ministério Público e a Polícia Militar entenderam que deveriam retomar o diálogo com as lideranças das torcidas organizadas.
Após retomarem os diálogos, Poder Público e torcidas organizadas buscaram pactos para diminuir a violência nos dias de jogos, antes de clássicos estaduais, sempre ocorre uma reunião entre Poder Público, Polícia Militar e torcidas para determinarem qual o trajeto que cada torcida deverá fazer, para que não ocorra nenhum registro de violência no dia da partida.
Depois de 1995 foram realizados inúmeros debates sobre os direitos e deveres das instituições que participam de uma partida de futebol e como elas deveriam agir para que a violência fosse reduzida nos estádios, esses diálogos foram os principais motivos para que fosse criado um estatuto, sendo assim no ano de 2003, surge a Lei 10671/2003 conhecida como Estatuto do Torcedor.
As proibições ocorrem até hoje, tanto é que no Estado de São Paulo as torcidas organizadas podem entrar com suas faixas, camisetas, instrumentos musicais, apenas em uma parte do estádio, ou seja uma parte da arquibancada é destinada à elas, caso um torcedor trajando uma camisa de uniformizada queira assistir em outro setor ele deverá retirar o traje da organizada.
A relação de brigas de torcida no futebol acontece no mundo todo, o modelo criado na Inglaterra, serviu de exemplo para combater este problema mundial, não é que o Relatório Taylor tenha que ser seguido à risca em outros países, até porque cada país tem a sua cultura e seus costumes, mas dentro dessas políticas de combate à violência relacionada ao futebol, devem ser criadas legislações com o objetivo de resolver essas questões que assombram as sociedades.
Com o exemplo da Inglaterra, a violência de torcidas não acontece só no estádios de futebol, ela também está presente nos bairros, estações de metrô e lugares com grande circulação de pessoas. No Brasil isso também acontece, mais um caso trágico de violência ocorreu recentemente, envolvendo torcedores do Corinthians e do Palmeiras, mas ao invés de serem no estádio foi em uma região afastada.
A região escolhida pelos torcedores para ter o confronto foi na Avenida Inajar de Souza, região da Zona Norte de São Paulo, a briga foi marcada pelas redes sociais logo pela manhã, torcedores se enfrentaram com armas e o torcedor da Mancha Alvi-Verde, André Alves de 21 anos, foi atingido por um tiro na cabeça e faleceu.
“Cerca de 500 torcedores de Corinthians e Palmeiras entraram em confronto na manhã deste domingo na Avenida Inajar de Souza, Zona Norte de São Paulo. A briga, que aconteceu por volta de 10h, acabou com duas pessoas baleadas e diversos outros com ferimentos leves. Após a chegada da Polícia Militar, quatro torcedores (dois armados) foram detidos e levados ao 72º Distrito Policial, na Vila Penteado. Rojões, pedras e paus foram as principais armas utilizadas pelos arruaceiros.”
”Membros de torcidas organizadas de Corinthians e Palmeiras entraram em conflito na manhã deste domingo, na Freguesia do Ó, zona norte de São Paulo, horas antes do clássico no Pacaembu (região central), pelo Campeonato Paulista. André Alves, o "Lezo", membro da Mancha Verde, foi baleado na cabeça. Ele foi levado em estado gravíssimo no Hospital Cachoeirinha, com perda de massa encefálica. No começo da noite, a Secretaria de Saúde de São Paulo confirmou a morte de André.” (GLOBOESPOERTE, online, 2012)
Com o avanço da tecnologia, está cada vez mais comum casos de brigas de torcida marcadas pelas redes sociais, acontecerem no local acordado. Normalmente os torcedores programam essas brigas horas antes das partidas acontecerem e o uso armas de fogo aumenta gradativamente, a violência dentro e fora dos estádios ocorre, pois a lei no Brasil ainda não é severa como na Europa.
Os aspectos sociais também interferem para que essa violência ocorra, pois apesar de nas torcidas organizadas terem todos os tipos de pessoas, das mais diversas classes sociais, a maioria dos associados são de periferia. Sendo assim, o jovem de bairro pobre, trabalha exaustivamente, não tem acesso à cultura e educação, sofre nas filas dos hospitais e lida diariamente com a desigualdade social. Tudo isso de maneira subjetiva desperta nele um sentimento de raiva, onde encontra no futebol, seu único momento de lazer, a hora de extravasar por tudo aquilo que ele sofre.
O Deputado Estadual pelo PSDB e Promotor de Justiça da época Fernando Capez afirma: "(...) o recrudescimento dos problemas sociais e econômicos, o considerável aumento da distância entre os segmentos sociais, o alastramento generalizado da miséria, a falta de emprego e de acesso a um sistema de educação e saúde minimamente adequados, entre tantos outros problemas, acabaram criando perigosos focos de tensão social".
Entretanto, mesmo ocorrendo essas brigas e a Imprensa repercutindo de modo sensacionalista, com o intuito de vender suas matérias, causando uma opinião preconceituosa e negativa sobre as torcidas organizadas, são essas instituições que seguem o clube pra qualquer lugar e demonstram apoio, paixão e fidelidade.
No próximo capítulo desta obra será feita uma análise do Estatuto do Torcedor, destacando os pontos importantes contra a violência no futebol e comentários sobre às inovações feitas pela Lei 12.299/10.
DOS REIS, Heloísa Helena Baldy. Revista Brasileira de Ciências Criminais, nº. 71, v. 16, São Paulo: Editora RT, 2008.
MURAD, Maurício. A violência e o futebol: Dos estudos clássicos aos dias de hoje. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007

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